Multi-instrumentista japonesa com um riquíssimo – e ainda demasiado desconhecido – legado que das canções à improvisação livre tem apanhado todas e quaisquer pontas soltas entre estas duas realidades, Eiko Ishibashi chega à ZDB com um percurso incrivelmente fértil de trabalho valoroso nos domínios da instalação, da produção, da sound art e sonoplastia, enquanto música de sessão ou em inúmeras colaborações entre o Japão e os Estados Unidos. Surgida no epicentro da sempre fértil cena experimental japonesa, Eiko começou por se afirmar enquanto baterista, sendo hoje o piano e a sua voz cintilante a assumirem uma preponderância iluminada, com passagem pela flauta e pelo vibrafone, desdobrando-se sempre com o mesmo decoro e inventividade.
Desse sem número de colaborações, que deu origem já este ano a um álbum em duo com o lendário Masami Akita (aka Merzbow), tem sido aquela que mantém com Jim O’Rourke a balizar de modo mais contundente os caminhos que tem traçado com o devido romance na arte da Canção. Membro permanente da banda de O’Rourke que gravou o impressionante Simple Songs no ano passado, Ishibashi serve-se dos préstimos dessa mesma banda para dar corpo às visões idiossincráticas da pop que tem vindo assinar em nome próprio ao longo de quatro álbuns. Contando com a bateria de Tatsuhisa Yamamoto e o baixo de Sudoh Toshiaki, a que se junta em estúdio a expertise do próprio O’ Rourke – recluso por opção em terras nipónicas – a música de álbuns como Imitation of Life ou Car and Freezer pauta-se pelo mesma precisão, rigor e panorâmica que tem pautado o trabalho do músico norte-americano na Drag City.
Com alguns pontos de contacto com a música de O’ Rourke, particularmente notória na produção reconhecível do próprio – cristalina e contundente, com espaço para respirar – e numa capacidade natural de aglutinar diversas músicas ao abrigo de melodias memoráveis, demarca-se uma linguagem só sua, de um lirismo enviesado e harmonias celestiais que parecem nunca se esgotar. Música em corropio de ideias, soberba de arranjos nunca impositivos, que sublinham a capacidade transformativa mas sempre segura e desarmante de canções que se vão descobrindo a si mesmas por entre o léxico da pop, da folk, dos cancioneiros na linha de Randy Newman ou Van Dyke Parks e da transmutação romântica da música ocidental pelo Japão sobre a forma de Enka. De uma pureza transversal, a música de Eiko Ishibashi chega à ZDB a flutuar no seu próprio estado de graça, a pedir descoberta urgente. Que seja neste dia. BS
piano, voz, flauta: Eiko Ishibashi | baixo: Sudoh Toshiaki | bateria: Tatsuhisa Yamamoto