Lançada em 2010 pela sempre presente Clean Feed, a estreia homónima do RED Trio afirmou desde logo o trio constituído pelo baterista Gabriel Ferrandini, pelo contrabaixista Hernâni Faustino e pelo pianista Rodrigo Pinheiro como uma das formações mais destemidas e desafiantes na descoberta de novas coordenadas no panorama da improvisação europeia. Assumindo desde logo uma visão panorâmica e brava em torno das potencialidades desse formato, a linguagem deste trio vermelho demarca-se das armadilhas académicas e formais que tendem a estratificar muitos dos trios desta natureza numa paisagem árida e cabotina, para criar um jogo de espelhos em mutação constante, como um fractal que se desdobra numa litografia de Escher. Sem qualquer tomada de posição hierárquica no processo.
Nesse desdobramento onde o léxico mais livre e feérico do free jazz se encontra com a suspensão do drone e a tensão de alguma música contemporânea, o diálogo aberto pelos três músicos mostrou-se também capaz de aceitar sem reservas outras vozes para se redescobrir continuamente. Excluindo os também muito recomendáveis Rebento e Live in Munich, a fértil discografia do trio pauta-se por um regime de colaborações – no verdadeiro sentido do termo – com músicos como Nate Wooley, Mattias Stahl, Gerard Lebik, Piotr Damasiewicz e de forma mais regular com o britânico John Butcher. Saxofonista em franca actividade desde os inícios da década de 80, cujo riquíssimo trajecto passa por encontros com gente como Derek Bailey, Phil Durrant, Oren Ambarchi ou Eddie Prévost, e com papel de indelével importância na improvisação europeia em diversas frentes.
Com Butcher, o trio gravou já dois justamente reverenciados álbuns: Empire em 2011 pela conceituada NoBusiness – que se assume cada vez mais com uma das mais valorosas e aventureiras editoras no seio do jazz e da música improvisada – e Summer Skyshift novamente pela Clean Feed no ano transacto. Integrando-se de forma admirável no vórtice criado por Faustino, Ferrandini e Pinheiro, o saxofone de Butcher enreda-se numa narrativa aberta sem nunca assumir para si qualquer tipo de protagonismo, imiscuindo o seu sopro de uma inventividade e lirismo inabaláveis numa gestalt volátil plena de cumplicidade, respeito mútuo e paixão. Aquilo que nos faz grandes. BS
