Em 2013, Maria Gil e Miguel Bonneville, apresentaram no Negócio em Lisboa, uma palestra performance intitulada Medo e Feminismos, reposta em 2014 no mesmo espaço, e integrada no Festival Temps D’Images.
Em 2015, e inspirados na máxima do feminismo radical dos anos setenta do século XX que proclamava que o pessoal é político, continuam este ciclo de palestras performance com uma nova criação desta vez dedicada aos temas: Amor e Política.
Como é que podemos pensar politicamente o amor? Como é que podemos pensar um assunto que é normalmente visto como sendo algo do foro íntimo e privado de cada um? Que relação têm os afectos com a forma como nos organizamos socialmente e vivemos uns com os outros? E será a política algo a que voltamos apenas em ano de eleições? Como é que vivemos a política nas nossas vidas, na privacidade das nossas casas?
Nesta palestra performance, a dramaturgia constrói-se à volta de entrevistas realizadas a políticos pertencentes a partidos com representação parlamentar, independentes, e pessoas ligadas a movimentos sociais; bem como, entrevistas realizadas a ex-namorados, cartas de amor e fragmentos de diários pessoais. Durante o espectáculo haverá a recriação de uma performance do século XX.
Amor
«Chegas a uma altura em que dizes: não, de facto, o pessoal é político, e isto não quer só dizer as questões medico-jurídicas da minha sexualidade; isto não é só relativo ao aborto, à violência doméstica e a quem lava os pratos em casa. Tem a ver com uma série de questões; como é que eu me relaciono com as pessoas, como é que eu me relaciono com a vida, que papel é que tem ou não o trabalho na minha vida.»
«Não é por acaso que se diz ‘comer o outro’. É isso, não é? As pessoas confundem o fazer amor com comer – e compreende-se porque, no fundo, eu quero assimilar o outro. Quero consumir o outro, como consumo avidamente o alimento ou a bebida, não é? ou outra coisa qualquer. É claro que depois há um upgrade – isto, no fundo, é o sentimento de privação do seio materno, que depois é substituído pela chucha – mas depois há upgrades, nós depois ao longo da vida nós vamos fazendo upgrades, actualizações da chucha – para a criança passa a ser, às vezes, o carrinho ou o brinquedo, ou a boneca para a menina, quando ainda existe esta separação dos brinquedos – ou depois passa a ser o triciclo, a bicicleta, depois passa a ser a mota, o carro, depois passa a ser o namorado ou a namorada, passa a ser a carreira, passa a ser a casa, passa a ser a reforma… Quer dizer, há sempre qualquer coisa que nós procuramos, idealizando isso como alguma coisa que vem satisfazer-nos para sempre. Vem fazer da nossa vida um belo conto de fadas, como se diz. Procuramos sempre alguma coisa que nos venha tornar felizes para sempre. E muitas vezes é a isso que chamamos amor.»
Política
«Uma transformação sociopolítica do mundo, a meu ver, tem que passar por uma política da consciência. Por uma transformação do modo como eu percepciono o mundo, uma mudança cognitiva. Eu a isto chamo, às vezes, política da consciência ou micro-política da consciência, às vezes chamo a isto política da consciência e do coração – porque penso que também tem que ter a ver com uma abertura do coração, no sentido de não ser só uma mudança intelectual, em termos de visão do mundo, mas é também uma mudança a nível do sentimento, um sentir que o outro não está separado de mim.»
«Para mim a política não é, obviamente, o que se passa no parlamento, acho que isso não é política mesmo; é uma representação. Política, para mim, é a maneira como as pessoas se organizam a resistir ao capital ou ao estado, não é só no sentido das grandes manifestações, mas o que fazem no quotidiano ou não fazem ou a maneira como se perspectivam diferentes coisas.»