ZDB

Música
Concertos

Dedekind Cut ft. Alex Zhang Hungtai

dom08.10.1722:00
Galeria Zé dos Bois


Não é o destino em si que interessa. É a mudança de cenário.

Numa das muitas impressões de Brian Eno sobre a música contemporânea, aquele que é tido como o expoente máxima do registo ambiental, parece ter antevisto a obra de Dedekind Cut no tempo. Eno, tal como Basinski, Aphex Twin ou Coil, cunharam, de modo distinto e pessoal, toda uma filosofia na escuta de música – e, na verdade, entender o que por detrás dela se esconde. Uma forma abstracta para além da figura concreta e material, ou, se preferirmos, uma identidade anímica além do identificável. No ano em que surge uma importantíssima compilação chamada ‘Mono No Aware’, editada pela PAN, Fred Warmsle aka Dedekind Cut apresenta ‘$ucessor’, um dos mais brilhantes registos discográficos de 2017. Ambos apontam direcções futuras ao conceito popularizado na esfera pop por Eno, em que a deslocação espacio-temporal é uma realidade.

Outrora reconhecido produtor no hemisfério do rap enquanto Lee Bannon, onde foi homem de confiança de Joey Bada$$ ou da trupe Pro Era, Warmsle tem vindo a emergir de uma profunda reinvenção pessoal. Passou por vários heterónimos, colaborações e demais diálogos criativos que edificaram, de uma forma ou de outra, as potes que o guiaram até aqui. Cinemático, e até metafísico, a estática e ruído rodopiam micro-melodias em estado líquido e em constante movimentação. ‘American Zen’ é o resultado de uma descolagem estética, um misto de delírio lynchiano abençoado por DMT. A sua toada cintilante, e em câmara lenta, desde logo alcançou um lugar muito especial no espectro da música ambiental, tornando-se num clássico instantâneo.

Contudo, o profundo glaciar veio a encontrar fogo e paranóia. ‘$ucessor’ mergulha ainda mais fundo nas propostas suas iniciais, imprimindo novas jogadas sensitivas. Partilhando de uma visão beatíficamente desfocada, mas em modo panorâmico, encontram-se familiaridades a outros produtores contemporâneos como o venezuelano Arca, o britânico Leyland Kirby ou o norte-americano Yves Tumor. Um objecto de sensibilidade urbana, e no entanto tão próxima da fauna e flora para além do betão. Dessa conjugação harmónica, nascem inevitavelmente postais sonoros ainda por cartografar. A primeira audição é uma genuína expedição que não cessa de surpreender ao longo das seguintes incursões – com lugares, personagens e caminhos sempre diferentes das anteriores.

Nesta reentré da ZDB, a aterragem de Dedekind Cut por cá representa um fascínio vívido assistir a alguém que sentimos que, definitivamente, veio para ficar e dar que falar. O zeitgeist da mudança, do híbrido e da gloriosa indefinição. NA

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