Apesar de alguma mitologia pop propagar a ideia de “confronto”, o peace and love e o no future, a verdade é que entre o psicadelismo e o punk existe uma coabitação bem mais saudável do que a aparente. Afinal de contas, entre a alienação do primeiro e o abandono do segundo existe todo um trajecto cuja forma se pode traçar até ao momento em que os miúdos mais entediados dos swinging sixties pisaram o pedal de fuzz para uma posteridade documentada em séries de compilações como a Pebbles ou Nuggets. Pegando no caso dos Destruction Unit, não haverá propriamente nada que os faça recuar até aos terrenos rafeiros do garage rock, mas olhando para o seu arco evolutivo há toda uma vivência punk alimentada a psicotrópicos impossível de escapar. Comandado por Ryan Rousseau (aka Elvis Wong), este colectivo mutante do qual fez parte o falecido Jay Reatard, começou como um projecto synth-punk destes dois numa altura em que os Reatards começavam a causar estrilho em meios mais mediáticos. Lançadas essas sementes através dos álbuns Self Destruction of a Man e Death to the Old Flesh, seguiu-se uma pausa sabática que viria a ser interrompida em 2010, após a morte desse último. Talvez por causa disso mesmo, o regresso marca também a fuga completa para fora do pardieiro punk mais hermético e a chegada a territórios definitivamente mais expansivos. Eclipse e Sonoran mostram a banda enredada em conluios space rock, algures entre a aridez desértica do stoner e as paisagens cósmicas da galáxia Bardo Pond, alicerçados na precisão rítmica do krautrock mais feérico. Com o lançamento discreto de Void a ter lugar já em 2013, é no entanto com Deep Trip que todo o potencial da banda se revela numa linguagem personalizada. Com lançamento previsto para breve pela cada vez mais influente Sacred Bones, Deep Trip vê a banda a amplificar todas as coordenadas do passado a um patamar de expressividade a tender para o absoluto. Embrenhadas no negrume característico da editora nova iorquina, as canções de Deep Trip erigem uma manta densa onde as três guitarras se espraiam em todas as direcções encharcadas em delay, flanger, distorção e demais parafernália alucinada, sobre um stomp de bateria alimentado a anfetaminas. Como que a potenciar a catarse, a voz de Wong paira em afectações de crooner rockabilly, num miserabilismo narcótico que deambula sobre o abismo para onde esta música parece sempre convergir. Nesse ponto, um título como Deep Trip é auto-explicativo. Há que assumir a viagem sem medos.