Inventora de formas e mundos sediada em São Francisco, Victoria Chen tcp Evicshen tem revelado a sua labuta incansável de uma forma tão transparente quanto destemida, deixando pistas e remates sobre os seus processos contínuos de reinvenção. Curiosamente, e promovendo uma visão totalizante para a sua arte, esses processos – técnicas, materiais, conceptuais – são indissociáveis da mesma, promovendo uma relação íntima entre o espaço físico-auditivo e o corpo. Paleio que tem corroído muita sound art e performance, mas que aqui revela uma fisicalidade quase táctil. Expressiva e muito real. E é precisamente nos interstícios entre a sound art, a música e a performance que esta (também) construtora de instrumentos se posiciona com notável visão, criando as necessárias pontes que unificam tudo isto. Uma e a mesma coisa e uma outra coisa ao mesmo tempo.
Os instrumentos electrónicos por si inventados ou reimaginados, que tanto passam por sintetizadores modulares DIY, como pela amplificação de diversos objectos ou pela criação caseira de discos de vinil a partir de resinas, que são depois manipulados a partir das suas “unhas-agulha” – permitindo tocar até cinco secções de um mesmo disco em simultâneo – são fonte para uma música bruta na abordagem mas com plena noção de detalhe e dinâmica, escapando ao bro-centrismo do harsh noise bovino e ao embuste estéril do ruído digital mais hi-tech, mesmo que a intensidade do volume, do ruído e de um posicionamento físico tão confrontacional quanto agregador sejam pedra basilar em todo o ataque sensorial. ‘Hair Birth’, documento áudio lançado em 2020 continua a ser uma forma válida e essencial para chegar à sua música, mas dada a inquietude orgânica perante aquilo que fez, faz e virá a fazer e como cada actuação se liga intimamente ao local onde actua, estamos já num outro ponto da vida de Chen. E da nossa, para o testemunhar. BS