De fora e sem grande contexto a união destas três figuras podia parecer meio inusitada, mas com conhecimento de causa sabe-se que paira aqui um enorme respeito mútuo e amizade a consolidar esta parceria triangular. Nascida para performance – até agora – única no Blues Photography Studio de André Cepeda em Novembro do ano passado, uniu a voz de Maria Reis à bateria, percussão e amplificação de Gabriel Ferrandini e ao apurado sentido cénico de Cepeda, no uso do fumo, da projecção e da fotografia. Momento iluminado de liturgia que arranca agora uma nova editora aqui no burgo com o nome de Trás-os-Montes Records capitaneada pela mãe Cepeda, e que é mostra possível desse acontecimento especial – quem não esteve tem no disco aqui um falso recuerdo obrigatório – e se “repete” agora. Outra forma certamente.
‘Live Performance, 2018’ ao início manda aquele peso solene da invocação que associamos ao paganismo, mas trata-se afinal de uma ideia de música de devoção transversal a pontos geográficos que tanto podem ser os cantares transmontanos – como ‘Li-La-Ré’ ou ‘Viste Lá o Meu Amado (Paixão)’ captados por Giacometti e Lopes Graça – como a história do gospel ao doo-wop ao r&b/soul ou ao butoh e demais cartografias ancestrais e eternas. A voz numa aura de suspensão etérea em jeito de procissão pausada, gravitando em torno das acentuações rítmicas e tímbricas dos tambores e do processamento discreto de Ferrandini, tudo muito sóbrio, com tempo para acontecer e respirar. Sem entrar por clamores ou pseudo-bruxarias, a focar o essencial. Música séria e muito bonita. Aqui da terra. BS