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Garcia da Selva ⟡ João Lobo

sáb24.06.1722:00
Galeria Zé dos Bois


Garcia da Selva
João Lobo

Garcia da Selva apresenta "Radical Savage" ⟡ João Lobo apresenta Nowruz

Garcia da Selva

Personagem em permanente fluxo, Garcia da Selva é o enigmático heterónimo de Manuel Mesquita. Seja na música, no cinema ou nas artes performativas, a sua presença é quase ominipresente no panorama nacional, marcando posição onde realmente interessa estar, independentemente da área ou formato (na verdade, o mais provável é que já se tenham cruzado com ele, em certo momento, mas sem darem conta disso). Antes da sua actual carreira a solo, tocou ao lado de João e Norberto Lobo nos Norman, banda de cartografia sonora fascinante que ainda continua no segredo dos deuses. Na tela, podemos vê-lo em filmes de João Nicolau, Miguel Gomes ou Sandro Aguilar, enquanto contribui com frequência para diversas trilhas sonoras ou instalações artísticas. Em suma, uma obra desde logo multifacetada e pertinente, suficiente para o distinguir como um dos ‘genuínos’ dos nossos tempos.

‘Mineral Music’ foi é um dos objectos sonoros mais singulares numa lógica de memória recente. Editado na também nacional Urubu Tapes, não será surpresa ter nascido no âmbito de uma exposição, transmitindo uma plasticidade urbana que tanto se reconhece na new age como na garimpa de sons circundantes. Apresentado como the only transparent mineral tape ever produced, é, sem dúvidas maiores, uma porta aberta para os sentidos. Autor de viagens sci-fi em combustão lenta, delírios disco-muzzak ou lirismo kitsch apurado, Garcia da Selva faz contemplar, incute estranheza e diverte com uma subtileza eficaz.

Quanto a esta apresentação no Aquário, será realmente especial. Marca antes de mais o lançamento, em primeiríssima mão, de um muito aguardado novo disco. Radical Savage é mais uma peça no seu puzzle biográfico – e igualmente na produção musical deste ano feita por cá. Com dois longo temas, assina uma magnífica ode estelar, passando do barroco ao retro-futurista, não esquecendo ainda o tropicalismo pop ou o esplendor atmosférico de outros tempos. A familiaridade com que atravessa cada paisagem é, no mínimo, adorável. Um álbum com a capacidade de comunicar de um modo peculiar, como poucos. De resto, tem o carinho habitual das edições de autor no seu formato em vinil e conta com a distribuição em fita magnética da supra-citada Urubu (o cunho gráfico da edição em vinil é da responsabilidade da Oficina Arara, serigrafado a partir de uma pintura de Mafalda Santos). NA

João Lobo

Raras vezes os limites da percussão – e da bateria, mais precisamente – foram abordados de forma tão essencial, tão desafiante, por cá. O pensamento surge com destreza para uma incondicional entrega a longo do seu último ‘Nowruz’. Naquele que é para já um dos portentos de 2017, o músico arranca da terra e puxa dos céus um inebriante ritual rítmico transfronteiriço. Com a mão da cada vez mais obrigatória da suiça three: four (onde também Norberto Lobo tem vindo a lançar os últimos discos), o conceito de música exploratória cobra aqui um tom admirável. A busca pela fantasia parece guiar as mutações múltiplas que surgem durante os nove momentos que o compõem – e essa é, como sempre, a melhor das intenções.

Contemporâneo de outros fenomenais como Marco Franco ou Gabriel Ferrandini, a linguagem de Lobo assenta unicamente no acto de não assentar. Passando o niilismo que possa sugerir a súmula, a suspensão e ascensão representam duas formas de existir em ‘Nowruz’. O título nasce de uma referência cultural ao Fim de Ano iraniano cujo significado poderá ser traduzido de ‘novo dia’. Caberá a cada um imaginar o forte simbolismo da expressão, contudo a direcção será certamente unânime; é definitivamente uma nova fase para o baterista. E que fase.

De certo não abundarão obras onde este instrumento tome uma posição central, de emanação livre. O papel dos restantes intervenientes é revertida da tradição, orbitando em redor dos pratos, da tarola ou do timbalão. A riqueza dos climas criados e a habilidade de gestão nos detalhes elevam cada faixa a um patamar além de exercício de busca per se; osso e músculo sim, mas sem esquecer alma. É pois notório que há muito que Lobo sonhava em fazer algo assim. Gravado sem recurso a overdubs ou amplificação acústica, o sentimento telúrico fervilha como um vulcão. Eventuais aproximações a Sonny Sharrock ou Tom Zé, atestam o carácter simultaneamente feérico e feroz de uma música que rasteja, respira e uiva. É o perfil legítimo de quem edita o seu primeiro álbum a solo após uma década de outras vidas e outras estórias.

Pela ocasião festiva, uma apresentação singular: João Lobo tocará precisamente no centro da sala, também ele alterando a disposição habitual do espaço. Será inesquecível e ninguém aceitará menos que isso. NA

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