Trillionaires, o álbum de estreia do colectivo de Flexico, Internet, Goth Money Records, o último sonho de Barron Machat, o visionário da Hippos in Tanks, é o som surdo do futuro, o pulsar que vibra entre as paredes e as peles derivado dos milhões de telemóveis que emitem frequências e radiações e nos transformam a todos em mutantes.
Hunned Mill, Kane Grocerys, Karmah, Luckaleannn, Black Kray e MFK Marcy Mane são uma crew telepática, com alianças criadas em chat groups, com reuniões feitas não na esquina em frente à liquor store mas no snapchat, com tags espalhados não pelas paredes do bairro mas nas contas de Instagram. Trillionaires é, por isso mesmo, um sinal dos tempos. Não apocalíptico, mas real. Honesto. Transparente como água límpida. E tão difuso como uma miragem. (Escolher o que interessa.)
GOTH significa Gods Over This Humanity. A ideia que anima o grupo, apesar da tonalidade negra do trap que praticam, é positiva e todos os membros acreditam na força dos impulsos positivos. Isso nasce de uma vontade de superação, de fuga à realidade de que cada membro conhece o tutano, de ruas onde black lives don’t matter, de cidades que oprimem mais do que libertam. “Depois de fazer tanta merda”, explicam, “só resta olhar para o mundo com outros olhos”.
Claro que a ideia nocturna de um sentido puramente americano de gótico atravessa o subtexto musical deste grupo: tons menores, arrastados, como se esta música fosse produzida durante um sonho ou melhor ainda durante uma alucinação; e depois há o sentido estético dominante nas roupas, com o grupo a adoptar sobretudo cores escuras e a não se importar de usar t-shirts de Linkin Park ou Korn não como afirmação de algum tipo de filiação musical, mas como uma oblíqua declaração de moda – um grupo de miúdos negros dos projects que pega numa “farda” dos subúrbios brancos de há uma década ou mais e a reclama tem que ter um significado mais profundo do que simplesmente um redondo “why not?“… Certo?… É perguntar-lhes, agora que eles estão para chegar.
Com DJ Screw ou Madlib por referências, este grupo escolhe afinal evoluir entre a desaceleração e o expressionismo psicadélico, como se a realidade não fosse, afinal de contas, para aqui chamada. É preferível viver dentro de um filme, dentro de um conjunto de cabeças, dentro de um enredo que só eles mesmos conhecem, dentro de uma cidade onde ninguém vai. Aliás, Flexico, o espaço para onde a imaginação destes tipos remete, não existe. É uma fantasia. Uma projecção. Um túnel para escapar ao gueto. Lá, onde os Deuses se encontram acima desta humanidade. RMA