Jaz aqui, na pequena praia extrema é um projecto colectivo de carácter experimental que – sublinhando o carácter inacabado da obra de arte – age de forma contida, despojada, onde se dilui a noção da autoria individual: tudo foi debatido por todos, na procura de possíveis consensos. O título da exposição, retirado da Mensagem de Fernando Pessoa, expande, aqui, o seu contexto original de reflexão sobre a nação (um país à espera de se concretizar) em direcção a um território mais amplo: o do humano e seu ímpeto civilizacional, simultaneamente criador e destruidor. Retomando a noção de conflito, é necessário um embate, um confronto, com o que existe de mais profundo e íntimo em cada um de nós, para que, desse lugar cavernoso e obscuro possa surgir a luz, talvez dizer, que é necessário destruir para dar nascimento, e prosseguir assim com o ideal humano de se sonhar a si próprio, essa elaboração de um projecto sempre em ascensão.
Assim, a exposição estrutura-se, literal e metaforicamente, sobre um conjunto de traves de madeira que ocupam todo o primeiro piso e nos colocam perante a fragilidade do edifício e do seu sustento. Confrontando-nos com essa realidade desoladora, de que tudo assenta sobre bases perecíveis e volúveis. Apresentadas em bruto e sem qualquer iluminação, as vigas de madeira aparecem débeis, encenando um espaço em que a obra se concretiza na sua vivência; uma experiência de deambulação por um espaço vazio, que é uma espécie de antecâmara precária a preparar a subida ao segundo piso. Aqui, à fragilidade da madeira, opõe-se o peso da pedra; o chão está coberto de entulho: restos de tijolo, fragmentos de azulejos partidos, cimento, detritos do que outrora terá sido construído e que entretanto se desmoronou. Como se pudéssemos pisar um chão feito de destruição e ruína… Mas eis que, sobre os escombros, feixes de luz nos fazem esquecer o cheiro próprio do entulho. A obra de arte rasga, intervém, surge como prova de um humano ainda porvir. É o apelo à magia primordial da luz e à força evocativa da imagem perpetuamente reanimada pelo olhar que a atravessa, imbuindo de vida objectos e imagens. Como nos diz Emily Dickinson: se eu tenho sensação de que a cabeça, é como se estivesse a ser-me arrancada, eu sei que é poesia. No fundo, o lugar de toda esta erupção é a marca de uma vivência transformadora e que espera, agora, continuar a agir: agente activo e espaço de encontro.
Dia 3 de Outubro – Encerramento: Visita guiada; conversa; jantar; performance.
A 5ª edição das ‘Residências Artes Visuais ZDB’ decorreu entre 8 de Abril e 25 de Julho de 2013