Desde logo acariciada por Lisboa, a sua relação com a cidade faz a abertura do novo álbum ‘Will’. A estação de comboios de Santa Apolónia dá título ao momento inicial, captado nesse mesmo local aquando da sua última passagem por cá. Uma casa abandonada em Nova Iorque e a fábrica da mítica Moog completam os espaços que serviram de laboratório a estas nove composições de Julianna Barwick. Ainda com ‘Nepenthe’ bem presente na memória colectiva, eis que a cantora norte-americana se lança a um campo sonoro brilhante de novidades. A beleza cíclica da sua música mantém-se como força gravitacional de tudo embora dando a mão a uma gama de instrumentos e paisagens relativamente alheias até então. O piano surge desolador (recordando, desde logo, ‘Ruins’ de Grouper), o violoncelo define formas (imagine-se Rachels), os arpeggios do sintetizador trazem subidas e escaladas vagamente electrónicas e a voz, essa, parece fundir-se com a mais orgânica das naturezas. Existe uma essência curativa, digna de renovação e de plena harmonia na sua obra. ‘Will’ parece pois agregar o passado e o presente projectando um futuro de coração aberto às explorações vocais – de onde nasce a sua expressão.
Regressada de uma temporada de apresentações com gente tão respeitada e díspar como Yoko Ono, Philip Glass ou Flaming Lips, não obstante as colaborações que manteve, em estúdio e ao vivo, a feitura criativa continua a pertencer só e apenas a Barwick. Como uma partilha de um firmamento intrínseco à sua identidade, neste compêndio volta a tomar a realidade em que ecoa com a graciosidade de uma catedral. Os movimentos melódicos que se escutam cedem a uma lógica de crescendo e continuidade em jeito de cristalização temporal. Vagueando entre o canto religioso, a pop ambiental e uma proximidade às noções clássicas, a sensibilidade musical da artista não pertence exactamente a uma época exacta ou a um género específico; daí a energia anímica – mais que física, mais que reconhecível – cuja dimensão se sente a cada escuta e a cada novo álbum. NA