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Concertos

Kelela

sex02.05.1422:00
Galeria Zé dos Bois


Tomando o hardcore continuum projectado por Simon Reynolds como linha condutora para a cartografia da música de dança nascida em ilhas britânicas, o flirt entre esta e o R&B teve particular expressão com o advento do 2-step/UK Garage. Materializado em inúmeras bootlegs, numa manobra de pirataria benigna que viria a originar clássicos como a remistura dos Architects para ‘The Boy is Mine’ de Brandy e Monica ou ‘Case of the Ex’ da Mýa por Sovereign. A chegada do dubstep trouxe consigo um nível de testosterona de tal modo elevado que a feminine pressure parecia definitivamente afastada destas movimentações, mas a refracção desse género dormente para campos cada vez mais indefiníveis trouxe consigo novas possibilidades de coabitação.

Apesar da gigantesca separação geográfica e génese distinta, tanto a californiana Fade to Mind como a londrina Night Slugs habitam um mesmo comprimento de onda que timidamente tem vindo a injectar partículas R&B no seu código genético – samples de ‘Me & U’ da Cassie na ‘That Mystic’ do Kingdom ou a já clássica mix ‘Perfect Lullaby’ dos Nguzunguzu. No entanto, todos estes acessos viviam ainda enquanto resquícios num trabalho de produção que não contemplava abertamente as canções. Essa persona veio-se a revelar em 2012 na forma de uma cantora norte-americana de origem etíope de nome Kelela Mizanekristos quando “Bank Head”, produzida pelo Kingdom, surgiu gloriosa no seio destas movimentações nocturnas.

Primeiro caso de identidade real na miscigenação entre as hordas nascidas nessa linhagem a que se convencionou chamar de post-dubstep e o R&B, para além do mero sampling e cut-up de clássicos, “Cut 4 Me” da Kelela trouxe as canções para o epicentro onde operam as crews da Fade to Mind e da Night Slugs, com considerável equilíbrio entre forças gravíticas. Sustentadas em igual medida numa escrita lânguida e elegante e num arsenal sónico esquivo e intrigante – onde além de Kingdom podemos encontrar nomes como Bok Bok, Jam City ou os já citados Nguzunguzu – as canções presentes na mixtape de estreia de Kelela abriram caminho com uma inegável segurança por entre resquícios grime, techno, jungle ou dubstep para chegarem a um estado de harmonia quase platónico.

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