Cada vez mais essencial para compreender o que de valioso se vai criando na pop de “vistas largas”, Laurel Halo tem edificado uma obra tão peculiar quanto acutilante. Irrepreensível enquanto exploradora de texturas e brilhante criadora de escapes sonoros, parece preservar, acima de tudo, essa eterna e difícil arte da canção. Contrariamente a outros autores contemporâneos, circunscritos a um laboro quase científico e até gélido, Halo recorre a uma multiplicidade de idiomas musicais guiados por busca intuitiva só possível a quem se entrega segundo uma noção genuína de experimentação – com todo o lado humano que isso acarreta. Uma via que se traduz em composições perdidas no espaço e no tempo, vaporosas e borbulhantes, de encontro à própria voz da artista e em direcção ao preenchimento emocional. Em vésperas de lançamento do seu álbum de estreia ‘Quarantine’, com o selo da Hyperdub (editora responsável por discos de Burial, Hype Williams ou King Britt), Laurel Halo regressa ao local que acolheu a sua estreia nacional para apresentar, em primeira mão, um dos discos que fará certamente parte da dieta musical deste 2012. Capítulo imperdível no acompanhamento, em tempo real, de uma carreira ainda curta mas definitivamente imensa. E a sensação de que tudo isto é apenas o início. NA
Laurel Halo ⟡ Gala Drop
Laurel Halo
Gala Drop
Como é bom ouvir os Gala Drop em “Broda”, o belo EP que gravaram com Ben Chasny. Parecem encantados pelo som da guitarra. Mais eléctricos sem perderem o groove. Entregues aos ritmos de uma dança libertadora, mas sempre disponíveis para momentos de contemplação. Aviso: não se tratou propriamente de uma transformação definitiva. Antes de um mutação temporária, evolutiva, que abre territórios à banda formada por Nelson Gomes, Afonso Simões, Guilherme Gonçalves, Rui Dâmaso e Jerry “the Cat”. A presença das congas de Jerry “the Cat” percebe-se importante. Faz os Gala Drop tocarem no chão. A música desce do céu para se deixar contagiar pelo som. Perde geometria, ganha curvas imprevistas. Robustez funk. E imaginamos a “família” de Sly Stone nascida e criada em Lisboa. Evoque-se, também, a guitarra de Ben Chasny que, audaz, grave, melancólica, enriquece a paleta dos Gala Drop. À bateria de Afonso Simões, oferece espessura, corpo, agita-a à beira do delírio. Aos acordes do teclado de Nelson Gomes, impõe tensão e contraste. E, pelo caminho, nunca perde de vista o baixo de Rui Dâmaso. O resultado é uma magnífica jam session que atravessa as cidades de Colónia, Filadélfia e Lisboa. O concerto desta noite não conta com Chasny. Mas a memória da sua colaboração, não tenham dúvidas, vai assombrar os Gala Drop, banda em constante e irrecusável trânsito, entre o passado e o futuro da música popular. Vê-la ao vivo é aceitar de imediato o repto que a alimenta. E entrar na viagem. JM