O mistério na arte tem um sem número de vantagens. E saber fazê-lo bem é também uma arte. Há casos globais, famosos e presentes, como o de Banksy e, num nível menos estratosférico, e só na música, os Sault. A cultura musical britânica tem uma avidez única em criar estes imaginários, disseminá-los e ir tornando-os universais a um ritmo saudável. Nas margens, a coisa também funciona, pense-se em Dean Blunt, seja com os extintos – será mesmo assim? – Hype Williams, os projectos que assina e como edita alguns dos álbuns ou a editora World Music Group Label, de onde saíram bar italia e Joanne Robertson, que visitam esta casa no passado recente. Isto a propósito de um nome que orbita Dean Blunt, mark william lewis. Há pouca informação online sobre o músico, seja por discrição ou marketing. Ao ouvir tem aquele efeito que às vezes as coisas em volta de Dean Blunt provocam: poderia ser ele num momento de experimentação.
Mas não é. Contudo, lewis parece saído do laboratório dos “Black Album” pela forma como o singer-songwriter londrino escreve canções que confluem géneros, entre vigor pop, cheesy soul e alusões a jazz. A coisa fica por aí, é mais o primeiro impacto, a sensação de virtudes semelhantes. Nada que seja estranho ao que está a acontecer na música britânica actual, lewis está em linha com os contemporâneos e conterrâneos Tone ou Coby Sey nesta procura de uma nova canção que sirva os tempos e as ferramentas de hoje. A diferença está no tom, no trabalho já editado, seja nos EPs “Pleasure Is Everything” ou “God Complex”, ou no longa-duração editado no início de 2023 “Living”, a música de lewis existe no fio constante de algo a quebrar. Carrega o tempo, procurando uma alegria num mundo durante e pós-pandemia. mark william lewis fascina porque convence, ou aceita, que as cores lá fora mudaram e há que saber viver e escrever sobre isso. Não podemos ter certezas sobre como o artista vive esse mundo, mas sabemos como o escreve, melhor, descreve nas canções. lewis transpira a desconexão relacional, o desconforto no toque, os nossos comportamentos obsessivo compulsivos despertados pela nossa fixação com o eu, a perfeição e a vontade do jogo ser jogado com as nossas regras. Canta experiências vagas que ficam a ruminar no presente, abrindo feridas ao invés de fechar. mark william lewis não procura conforto e, sim, confronto. Consigo, com demónios, com o mundo. É assim a canção que precisamos para o próximo futuro. AS
Mark William Lewis ⟡ Prima
mark william lewis
Prima
Prima é o alter ego musical de Josseline Black. Cruzando sentimentos com factos, Prima é um exercício sobre os ritmos da saudade. O álbum “hot lava” é um palimpsesto para amar e não amar. Mergulhando nos meandros de batidas quebradas e acordes profundos, atingidos por um texto relâmpago. Spoken word que salta para a melodia e volta à linguagem. Prima é um projeto a solo destinado ao coletivo que existe em cada um de nós.