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Música
Concertos

MEDEIROS/LUCAS

— Lançamento "Terra do Corpo"

qua27.04.1622:00
Galeria Zé dos Bois


“Dois Quixotes perdidos em alto mar”. Não é uma constatação, é uma promessa que se exibe em jeito de auto-retrato. E que faz todo o sentido, mesmo se nos depararmos com a enganadoramente absurda pergunta: “E os moinhos de vento? Onde estão eles em alto-mar?” Os moinhos contra os quais estes Quixotes investem são as ilhas, essas consumidoras das energias dos ventos captadas nas velas das gentes. E de ilhas, a dupla Medeiros/Lucas sabe tudo o que importa.

Há um disco, Mar Aberto, a evocação da tal planície de água onde de vez em quando se erguem moinhos de pedra vulcânica. E há a promessa doutro disco, novo, Terra do Corpo. O mar e a terra, o céu e o abismo: também é de dualidades que se fazem as pessoas. E isso nem se esconde num projecto que leva um nome como Medeiros/Lucas.

E também há um passado que passa pelas experiências de Pedro Lucas n’O Experimentar Na M’Incomoda, que era um estudo electrónico sobre uma ideia de identidade. Em entrevistas, falam os dois do mar como uma metáfora do vazio. Falam de sintonias e de ideologia para justificar o facto das palavras fundas de Medeiros encaixarem tão bem nas sonoridades igualmente fundas de Lucas. São tudo abismos. E como bem sabe quem já colocou os pés à beira de um precipício, o vazio fundo exerce um inexplicável fascínio, por vezes uma quase irresistível atração.

Mas as canções de Mar Aberto são tudo menos vazias. Têm paisagem dentro. Emocional e real. Têm ecos de uma tradição. Tem gestos de desafio a tudo isso. Levantam perguntas e procuram ultrapassar margens, que é o que compete a quem habita ilhas-moinhos: superar a margem, o fim, o vazio.

Mar Aberto é um trabalho tremendo porque mexe com o que de mais fundo nos agita, Basta ouvir a canção que dá título ao álbum para se perceber: há qualquer coisa de Badalamenti, de banda sonora de sítio perdido, na canção; e depois, nas palavras de Medeiros, o sabor amargo de uma poesia que não quer ser flor bonita num vaso à janela – “onde puseram os teus olhos a mágoa do teu olhar? Na turba larga dos montes ou na planura do mar?” Só eles sabem. E agora a promessa de Terra do Corpo, onde, além de Pedro Lucas e Carlos Medeiros se encontram cúmplices indisfarçados, como Tó Trips ou Carlos Barretto ou Rui “Filho da Mãe” Carvalho ou Selma Uamusse e António “Ermo” Costa. Ligações que se fazem em terra e não se perdem no mar. A promessa quixotesca, permanece, pois claro. RMA

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