Aquando das minhas viagens do Porto para Lisboa por auto-estrada, observava sempre com curiosidade um pequeno trecho de paisagem que se apresentava pelo meu lado direito, imediatamente antes de chegar a Lisboa, uma espécie de garganta. Para quem se desloca a 120 km/h esse período de tempo são exactamente 21 segundos. A determinada hora do dia e quando a inclinação do Sol é maior, uma enorme sombra apodera-se do lugar, antecipando o crepúsculo, como se a noite chegasse ali primeiro.’ (1)
Um espaço onde tudo se organiza segundo o seu plano interior, sobretudo de acordo com as relações que nele se verificam entre os homens, animais e ambiente natural. O vale resulta desses modos temporais tal como o historiador francês Fernand Braudel o definiu: tempo biológico o do indivíduo, tempo social o das culturas humanas, das suas estruturas mentais, crenças, hábitos e costumes.
É esta infra-estrutura do lugar, das suas relações interiores e exteriores, a projecção mental do tempo que a história e estes lugares nos fornecem, a visão de uma paisagem em constante transformação, o silêncio que traz consigo, o objecto do meu projecto.
As peças deste puzzle parecem nunca se esgotar e são elas próprias capazes de formar tantas imagens quanto as que desejamos. De alimentar todas e quaisquer histórias. Este lugar constitui ambiguamente, perante aquela esmagadora realidade dos factos, um conjunto de coisas transformáveis e é esta possibilidade de elaboração de jogos polémicos, entre o subjectivo e o objectivo, entre a autenticidade e o falso, que motiva este trabalho.
(1) Excerto do texto da peça 21s, vídeo, 2010.
– Eduardo Matos