Quando se fizer o levantamento da cena de Williamsburg, Brooklyn, os Oneida figurarão inevitavelmente num pódio artístico. Este grupo foi o que, mais genuinamente, soube fundir géneros musicais, sem trair a sua condição originária: a de banda rock.
Guiados pelos espíritos inquietos de Kid Millions e Bobby Matador, deram-se a conhecer na última vaga do underground americano antes da afirmação da Internet. Foi um período fértil que merece ser revisitado, mas os Oneida, ao contrário de muitos dos seus pares, sobreviveram-lhe. E na década seguinte, com um trio de discos estupendos (“Enemy Hogs”, “Come on Everybody Let´s Rock e “Anthem of The Moon”), convenceram críticos e melómanos. Não foi uma história fácil, diga-se.
Para os radicais do noise-rock, pareciam demasiados elásticos, para o gang da DFA records, denunciavam um afecto suspeito pelo passado. Em resumo: eram músicos colecionadores de discos. Tinham o conhecimento, mas faltava-lhe a ironia (dos Trans Am, os seus antecessores estéticos) e porventura, segredava-se aqui e ali, a paixão dos sinceros. Era uma insinuação tola, claro, pois aos Oneida sobrou sempre entusiasmo e nervo. Basta aliás, escutar a bateria de Kid Millions em qualquer disco: ainda hoje bate como poucas. E não significa somente uma demonstração de força e prazer, alimentada por uma relação intensa com a história da música popular: é, também, subtileza. Esta foi a grande virtude dos Oneida.
A par de uma versatilidade incrível souberam sempre trabalhar, como artífices sérios e atentos, a repetição, a melodia, o ritmo. Só então punham a música a tocar. E como soava? Já lá vamos. A fusão de géneros musicais era feita a partir de um lugar como se sublinhou atrás. Tudo começava nas baterias e nas guitarras com o apoio precioso dos teclados (muitas vezes a encostar as cordas às cordas), antes de interiorizar formas que provinham do psicadelismo, do minimalismo, do krautrock, da folk, do stoner, do melhor indie-rock. Sem abolirem as raízes nova-iorquinas (as vénias aos Suicide, aos Dictators e aos Yo La Lengo são evidentes) adentravam-se noutras narrativas. O efeito era surpreendente. Nesse atrevimento, engoliam os Neu!, os Incredible String Band, os Simply Saucer, os T. Rex, os Blue Cheer, AC/DC ou Brian Eno. E seguiam em frente, sem sinais de arrependimento, exibindo até uma certa doçura, manifesta na voz de Kid Millions. Para trás foram deixando canções magníficas (“Up With People”, a faixa que James Murphy não soube desencantar), baladas que os Pavement nunca fizeram (ouçam “Rose and Licorice”), momentos de vertigem absoluta (“Each One, Teach One”) ou frescos pop (“Changes in The City”). Os Oneida seriam a última grande banda do indie-rock, não fosse este concerto na Galeria Zé dois Bois. Exacto, continuam a conjugar-se no presente. Já não há muitas assim. JM