Não deixa de ser curioso que Richmond, na Virginia, cidade que se afirmou como um epicentro do pensamento confederado durante a Guerra Civil Americana e que é hoje um “hub” de serviços ligados com os universos da política e da banca, seja a casa de Poozy e False Prpht, os dois membros dos Prison Religion. Sabendo-se de onde vêm ajuda — e muito… — a compreender o título do seu mais recente projecto: O FUCC IM ON THE WRONG PLANET.
Na verdade, este é o planeta certo para os Prison Religion: tragédias ambientais, caos político, um Trump na casa Branca, extremismos de várias espécies, violência absurda e gratuita por todo o lado, consumo desenfreado, deterioração das liberdades, tudo isso ajuda a explicar o seu som extremo feito de rimas gritadas, ruído abrasivo e beats que parecem cuspidos pelas entranhas de uma qualquer unidade metalúrgica. Na verdade, não há nada de extremo num som que parece espelhar o planeta (errado) em que vivemos. “Vivemos numa Idiocracia”, explicam Poozy e False Prpht, ou, na verdade, Parker Jones e Warren Black, dois artistas que se cruzaram pela primeira vez num aeroporto (um não lugar, certo?) na Carolina do Sul, em 2016, e que desde então têm produzido música ambiente para o apocalipse.
Na página Bandcamp do duo descobrem-se meia dúzia de lançamentos em que os Prison Religion (que já afirmaram não se importarem de se chamarem igualmente People’s Religion ou Prison Relations: “qualquer acrónimo cool usando o P e o R serve”, explicaram, mostrando uma atitude totalmente libertária face à identidade o que constitui, em si mesmo, um comentário a esta era de falsas existências nas plataformas sociais e de falsas notícias nos meios de comunicação) cruzam punk, techno, hip hop, toadas industriais e uma atitude “don’t give a fucc” que os coloca num universo muito particular em que habitam outros tipos afáveis como os Death Grips, por exemplo.
O lançamento mais recente disponibilizado pelo duo, RESONANCE IN EXOPLANETARY HYBRIDIZATION (bom título) consiste em remisturas de material de O FUCC… a cargo de gente como Lee Gamble, Swan Meat ou Geng, projecto que em tempos lançou uma homenagem chopped n’ screwed aos Black Sabbath. A viagem de reinvenção do som dos Prison Religion mereceu o carimbo da Halcyon Veil, editora (des)orientada por Rabit, que também assina outra das remisturas.
São estes, então, os Prison Religion que trarão o seu agit-industrial-techno-hiphop à ZDB para um concerto que testará a elasticidade da grande janela de vidro desta sala do Bairro Alto. Há-de tudo correr bem, certamente. RMA