No que ao rock diz respeito, todos sabemos onde ainda resta alguma experimentação com as formas: nos territórios menos colonizados do metal. Ou porque ainda é uma subcultura, ou porque nunca foi levado a sério, este é o género que mais genuinamente resiste à mercantilização, à internet e à cultura retro. Passa por todas, indiferente e (quase) incólume. Basta lembrar alguns nomes produzidos na última década e meia por essa resistência: Sleep, High on Fire, Electric Wizard ou Ufomammut e Corrupted. Pois bem, juntemos-lhes mais um: Process of Guilt. O nome engana – para todos os efeitos, a banda é portuguesa – mas a música, essa não dá tempo para equívocos. Doom-metal grave e grandioso, que se entrega lascivamente a mudanças de ritmo e tensão. Uma máquina furiosa mas segura, que não menospreza o groove, nem desconhece a existência de outras possibilidades para lá do metal; ou seja, despreza os clichés. O modo como trabalha a distorção é exemplar: os acordes, os riffs e tudo que a guitarra permite, embora encharcados em violência, ouvem-se límpidos. E nesse momento, uma filiação (que tem sido evocada a propósito do último disco, Faemin) faz todo o sentido. Os Process of Guilt recordam, aqui e ali, a abordagem artesanal de Earache – via Godflesh e da Blast First – via Head of David (e ainda poderíamos acrescentar mais gente). Mas a inspiração no melhor noise-rock industrial dos anos 80 fica por aí, em filigrana. Afinal de contas, esta é uma banda de metal de, enfim, longas e extenuantes canções. Das quais regressamos certos de que o rock, apesar de velho, ainda respira fundo. JM
