Atingido o marco das três décadas de percurso musical, Rodrigo Amado permanece um foco fervilhante no horizonte do jazz e demais confins da improvisação. Saxofonista maior, o também fotógrafo e crítico de música, usufrui de uma invejável reputação dentro e fora do país. Joe McPhee, Peter Evans, Chris Corsano, Paal Nilssen-Love ou Jeb Bishop constituem o seu rol de colaborações nos últimos anos, enquanto se tem apresentado, com certa regularidade, em encarnações como Hurricane, Lisbon Improvisation Players ou Motion Trio. Pelo caminho, tem atraído novos músicos e novos públicos – ou seja, o balanço ideal para um veterano que se preze. Num ano especialmente frenético para si, Amado prepara-se para um marcante tríptico a acontecer no dia 19 do presente mês. Três álbuns com edição oficial simultânea: “Live in Lisbon” e “The Principle Of Freedom”, ambos sobre o manto Motion Trio e na companhia de Peter Evans (com o selo No Business Records); e ainda o disco de estreia na aventura de Wire Quartet, naquela que se avizinha, desde já, como uma peça essencial no catálogo Clean Feed desta temporada. É precisamente nesse formato a quatro que regressa à ZDB, onde há tempos deixou uma fugaz, mas impressionante e rara, aparição a solo, momentos antes da actuação de uns CAVEIRA restituídos. Aqui, o sopro do mestre cruza-se com as valiosas presenças de Manuel Mota na guitarra, Hernâni Faustino no contrabaixo e Gabriel Ferrandini na bateria. Cada um deles portador de uma obra própria e colectiva indubitavelmente expressiva e fundamental nos quadrantes da experimentação sonora por cá. Como tal, e pegando nas pistas recentemente deixadas pelo grupo em palco, o nível de expectativa em redor desta obra fazia acreditar em coisas grandiosas que deveriam permanecer registadas para além da memória dos presentes. “Rodrigo Amado Wire Quartet” situa-se fortemente enraízado na facção hard-bop solidificada por Sonny Rollins ou Dexter Gordon, permitindo em seu redor uma chuva de estilhaços de distorção e feedback, gerida de modo hábil e diligente. Composições livres que interagem em prol de uma linguagem por vezes também próxima do blues, oscilando entre a densidade da força estática e o frenesim progressivo do clímax em grupo. Na essência, um disco que respira quando deve e explode quando pode, celebrando uma deslumbrante harmonia entre as dicotomias expostas. Um serão em que deverá esperar uma partilha real, convictamente abolicionista e universal. NA