Prolífera e surpreendente. Assim se pode adjectivar a aparentemente curta, mas intensa, actividade musical de Gunn. Contas feitas, já foram editadas mais de uma dezena de discos em nome próprio e mais uma mão cheia de colaborações, no mínimo, brilhantes. Das mais celebradas com Kurt Vile (enquanto membro dos Violators) e Mike Cooper, até à nata do experimentalismo norte-americano encabeçado por Marcia Bassett ou Bardo Pond. Este à vontade com que se relaciona entre diversos meios e géneros coloca-o, desde logo, numa posição de figura transversal e quase omnipresente. Receptivo a diferentes sonoridades e entendimentos, não será então de estranhar que durante a adolescência se tenha entranhado no punk hardcore para um pouco mais tarde descobrir o admirável mundo novo do psicadelismo e da música exploratória. Ainda hoje confessa estar em constante busca da sua identidade criativa, porém há muito que já demonstrou um valor inestimável na esfera songwriter actual. Ainda que se trate de um cenário imensamente habituado, talvez até sobrepovoado, a sua música comunica de um modo íntimo, directo e encantador como só os grandes conseguem – e, acima de tudo, sem boleias mediáticas. Revisitando a sua obra e atentando pela natureza do percurso, Gunn será uma espécie de ‘brother from another mother‘ de Jim O’Rourke – ambos representam afinal uma noção folk como ninguém no seu tempo.
Fascinante pela abordagem simultaneamente virtuosa e discreta, quase básica, centrando no essencial e recusando artifícios desnecessários, Time Off permanece enquanto pista máxima para os restantes capítulos que o antecederam. E desse passado poder-se-à encontrar uma indagação de raíz blues, atenta sim à força telúrica, mas também ao magnetismo das estrelas e exo-planetas. Algures a meio, Gunn deixou pingar a sua voz barítono num processo progressivo como cantor assumido, algo que aliás se avizinhava como passo natural, mas que levou o seu tempo. O seguinte Way Out Weather veio cimentar estas ideias e abrir ainda mais a palete de sons já existente. Escutam-se os ecos sempre influentes de Fahey ou Bull e as garridas cores étnicas fundem-se com o rock de direcção livre, a trazer os insondáveis Sun City Girls à memória. Ao longo destes anos já se denota o cunho pessoal na condição de guitarrista aficionado pelo belo, enigmático exótico. Apesar do ADN mestiço, a genética de Gunn só pode ser e soar norte-americana. Isto do prisma mais ancestral possível, ou seja, evocativa de extensos desertos, estradas infinitas e enormes rochedos.
Este será um regresso caloroso após uma breve passagem por cá em 2014, juntamente com o supra-citado Cooper, com quem gravou o álbum Cantos de Lisboa. Presença incondicional para quem busca o essencial na arte da escrita de canções neste tempo presente. NA