Os Glockenwise têm tudo para merecer o desprezo dos adeptos do novo rock português. Não cantam na língua materna, não reconhecem afinidades com precursores locais (não há homenagens, portanto) e, ademais, assumem um gosto selvagem pelo garage-rock, essa velha e esgotada forma musical, sem concessões à autenticidade. São de Barcelos, mas podiam ser de Barcelona, de Estocolmo, da Cidade do México, de Austin ou de Portland. Ou até de outra época, se existissem máquinas do tempo. Mas são mesmo de Barcelos e ei-los de volta em 2013 com novo e excelso disco, Leeches. Musica retro? Quem ouviu Building Waves sabe perfeitamente que este quarteto não persegue a inovação. Alias, voltou a fazer mais do mesmo: rock and roll impecável, directo, afiado, sem tempo para redundâncias e choradinhos. Leeches confirma o que já se sabia: que aos The Glockenwise a história do garage-rock (e respectivas descendências) não interessa como letra morta, objeto de culto serôdio, mas enquanto matéria viva da qual se arracam canções. E que canções. Nuno Rodrigues canta dominado por uma pulsão vital e romântica que lhe é transmitida pelas guitarras, pelo baixo, pela tarola, pelos pratos, pela eletricidade. E entre a voz e os riffs e o ritmo da bateria há um arrebatamento, choque que nunca sacrifica a coesão e a elegância das canções. Tudo acontece na altura certa: a entrada do piano, os coros, uma inflexão no ritmo (na fabulosa “Napoleon”), a excitação das guitarras (em “Losing – Doubt Manthra” ou em “Leeches”). Fala-se de garage-rock mas, na verdade, este disco está para além de categorias. Celebra o punk, a pop, o indie-rock e até o mock-rock (em “Goodbye”, a ultima faixa). Enfim, celebra a música popular como se esta tivesse nascido ontem. Com energia e gozo, sinceridade e humor. E o mais importante: celebra-a no lugar que lugar que a viu nascer. Em cima do palco, como fazem as grandes bandas. JM