1755. Sim, o título do primeiro álbum de longa duração de Vaiapraia e as Rainhas do Baile é a data do terramoto de Lisboa. Rodrigo Vaiapraia não faz por menos – cada canção pode ter a ligeireza da música pop e cada letra soar a um escrito adolescente, mas a sua dimensão confessional implica agitações pessoais muito profundas, sentidas e intensas. Daí, até, que o formato abraçado seja o punk, com a batida saltitante e a distorção de guitarra a cargo da mesma dupla riot grrrl que também actua como Clementine (Helena Fagundes e Shelley Barradas). Num tema em que se fala de “cruising”, não será certamente por acaso que surgem os versos «há momentos em que vejo o Joey Ramone a voltar / com dois acordes ele faz de mim uma rock star»; é só uma questão de perceber, levantando as camadas de sentido que nos aguardam… As muitas referências a Hollywood que o atravessam não tornam propriamente este disco em mais um produto da cultura de entretenimento – os aspectos formais desta são utilizados numa criação que é, de todo, contra-cultural. E a contracultura em causa é de confrontação e provocação das normatividades hetero e homo («vou dormir com toda a gente») ou das identidades fixas de género («levo as jóias / levo o meu biquíni»). Aliás, 1755 será o primeiro LP de temática queer explícita em Portugal. Nunca, como em “Sinos”, se ouviram dizeres como «Hoje é o dia em que casas com a Maria / Hoje é o dia em que perco o homem que eu queria») e nesse aspecto só podemos prever – ou esperar – que abane as consciências. O queercore nasceu finalmente em Portugal e Vaiapraia é o seu expoente máximo. Hoje é o dia em que ganhamos o homem que queríamos.
Texto de Rui Eduardo Paes