O portal incandescente aberto em terras japonesas com o abandono fuzzy marginal de Les Rallizes Dénudés, e continuamente escancarado ao longo de décadas numa difusão electrificada que segue por Speed, Glue & Shinki, Fushitsusha ou High Rise até Mainliner, Acid Mothers Temple, LSD March ou Boris de ‘Akuma No Uta’, persiste em viver no limite entre psicadelismo, ruído, velocidade e transcendência. Minando, pelo caminho e para sempre, o linguajar do rock para fora de fronteiras e postulado na escrita hiperbólica mas sempre vivida de Julian Cope no seu ‘Japrocksampler’. Espécie de encarnação do espírito da lendária PSF – sigla para Psychedelic Speed Freaks e nome do disco de estreia de High Rise – é nesse espectro que podemos encarreirar estes Green Milk From The Planet Orange. Formado no início deste século em Tóquio por dead k, A e Benjian – rapidamente substituído por T e com este a dar lugar a Damo na mais recente incarnação – este power trio de guitarra/bateria/baixo calcorreou mundo e deixou para a posteridade uma mão cheia de discos na Beta-Lactam Ring com o seu turbilhão de influência prog, psych e punk até um hiato em 2008. Ressurgidos em 2017 e com novo álbum – Third, que na verdade é o seu quinto – pela Inferior Planet em 2019, continuam a propagar uma música que descarta o virtuosismo estéril do prog mas recolhe aquilo que daí interessa, abrindo espaço à improvisação numa progressão que atira para estados alterados da psique através de uma cascata de riffs e solos em direcção ao infinito – fuzz e delay supremos – linhas de baixo repetitivas na tradição kraut e ritmos de bateria que tanto propulsionam quanto se deixam cair num abismo sem rede, com uma entrega e abandono bem punk, mas plenamente conhecedora do instrumento. E do seu potencial de elevação.
BS



