Algures na memória descritiva da música contemporânea, o electroclash surgirá ali, de breve mas intensa actividade. Já o techno, e as suas múltiplas ramificações e fusões, fazem-no fluir ainda hoje em cenários inovadores, num género que se transmuta em si. A canadiana Marie Davidson resgata estas duas noções base, sem qualquer revivalismo ou pretenciosismo, numa incursão improvável pela eletrónica com índole punk e por uma eterna luta de social. O tema Work It rapidamente transformou-se em hino trashy, num misto de urgência e hedonismo – com direito a remisturas de Jessy Lanza ou Soulwax. Uma de muitas portas abertas para o salão de baile afterhours de Davidson, pois a surpresa é uma constante. Pelo meio, uma liberdade genuína em esgravatar na pop mais obscura ou cinematografia Nouvelle Vague como mantra possível num mundo que poderá ter bastante mundos (e, porque não, submundos?).
Não existem caminhos previsíveis no trabalho de Davidson e explorando os cinco álbuns que até à data editou, ressalta uma visão ácida transportada para as letras. Se por vezes nos recorda a energia de Miss Kittin ou Peaches, noutras tantas, a matéria volve-se mais densa e enevoada, neónica até. Os últimos Working Class Woman e Renegade Breakdown trazem o selo da mítica Ninja Tune e espelham vivências ou epifanias (reais e imaginadas) sobre as ciladas do capital, cenas noir e a escrita de canções enveludadas – distantes deste tempo. Alguém que se reimagina constantemente, a artista faz-se reodear de exímios músicos cuja natureza das suas canções ganham diversas roupagens e visões.
Numa altura especialmente fervilhante no seu percurso, plena de colaborações e apresentações várias, a vinda a Lisboa traz-nos um sempre fugaz, mas essencial, vislumbre de uma constelação enigmática chamada Marie Davidson. NA