The Heart Pumps Kool-Aid surgiu o ano passado como espécie de miragem pop distorcida. Miragem essa projectada por Seth Graham a Mari Maurice aka More Eaze. O primeiro é co-fundador da Orange Milk, editora-maravilha que em 2020 editou o disco estreia de Luís Pestana, entre tantos outros. A segunda tem-se destacado pelas colaborações com Claire Rousay ou Dntel num léxico cada vez mais peculiar, único até. Ambos partilham de uma visão fragmentada que confronta realidade, neurose, sonho ou isolamento. Onde termina uma e começa a outra? Não sendo uma pergunta de partida a uma exploração ad hoc, é uma das muitas questões que a sua música eventualmente poderá levantar. A forma desintegrada e a essência delicada destas micro-composições parecem ganhar equilíbrio em paisagens digitais que se desvanecem num labirinto de silêncios e melodias.
Talvez o elemento mais notório nesta narrativa seja o uso do auto-tune na voz de More Eaze. Um efeito sonoro controverso, mas que aqui toma novos horizontes e encarnações pouco convencionais. De um modo meio inimaginável, existe uma qualquer força gravitacional que faz orquestrar as ressonâncias das cordas e dos teclados com o rasto estelar vocal. Recorda-nos, a espaços, as lições de Oneohtrix Point Never revistas madrugada adentro – e já com os primeiros raios de sol do dia a espreitar. É no limiar da natureza das coisas que More Eaze e Seth Graham encontram conforto e fluidez para desafiar as leis da suposição e da lógica; ou simplesmente remar contra a expectativa. Só assim as revoluções silenciosas acontecem. NA