Alexandra Drewchin é um retrato fiel do que se deverá entender por arte marginal. Uma visão, convicção e honestidade que tornam possível conceber o inconcebível, sempre com veneno e antídoto, lado a lado. Uma combustão lenta de emoções complexas e diversas heranças sonoras criando peças autobiográficas entre o celestial e o dantesco. Essa natureza esfíngica da sua música enquanto Eartheater é capaz de desorientar e afastar, na mesma proporção que convida e estimula. De resto, a presença física de Alex é desde logo um corpo em mutação, como se de uma performance se tratasse.
Ao lado do mago Gregg Fox, na bateria, formou os Guardian Angel, uma das mais maravilhosas convulsões psicadélicas dos últimos tempos. Com os dois primeiros dois álbuns a solo, Metalepsis e RIP Chrysalis, deixou patente que o que fazia era algo urgente e dificilmente replicado. Pegando em elementos da electrónica, do noise ou da folk, germinou um território de experimentação quase panteísta. Essa dualidade de genética efectivamente urbana, mas de cabeça a gravitar em florestas, praias, desfiladeiros, desertos ou selvas. Em tempos, os norte-americanos Black Dice celebraram com genialidade esse estado alucinatório e agora, acidentalmente ou nem tanto, Eartheater chega ao porto onde o trio tinha abarcado dessa aventura. Embora a partilha desse olhar exista, a forma de o expressar é necessariamente diferente; a explosão sónica cede espaço ao mergulho metafísico e os retalhos de sons e vozes somam haikus. O interesse em redor do seu trabalho levou ao reconhecimento de Metalepsis como um dos melhores discos de 2016 (chegando ao título maior pela revista Fact), tendo sido igualmente convidada para plataformas mais familiares, como o por exemplo o Boiler Room.
Este ano, ela estreia-se numa das editoras mais fascinantes do momento, a PAN. E se muito do seu catálogo se tem tornado vital para um melhor entendimento da música contemporânea, então a presença de Eartheater é aqui mais do que devida. Ou seja, IRISIRI é a melhor entrada possível para este novo capítulo. Tanto se poderia especular sobre este terceiro disco, sabendo de antemão que não nos poderia chegar às mãos uma obra insípida. Mas o seu regresso surpreendeu, uma vez mais. Haverá certamente variados prismas sobre estas composições – e maioria deles procurando compreender esta noção de pop disfuncional criada por Alex. A matéria crua, o sentimento de pertença nómada e um olhar desafiador (artístico, e por isso social, político e pessoal) perante a realidade. Trabalha intencionalmente sob as potencialidades de um clima de tensão, equilibrando-se entre as nuvens e o fogo. IRISIRI explora, com uma legitimidade avassaladora, os limites da canção, o conceito de silêncio e os perigos da expectativa. É sob um intenso manto ambiental alimentado por ritmos esquartejados ao rap ou batidas house adulteradas, que nasce aquela que deverá ser uma obra fundamental deste ano. Esta estreia na ZDB traz uma oportunidade perfeita de escutar e observar como este magnífico e estranho mundo
de Eartheater se apresenta num palco. NA