Ao contrário dos bar italia, a banda que introduziu Nina Cristante a uma nova audiência, ela dá entrevistas. Não é que através delas se saiba muito mais sobre Nina, mas sabe-se um conjunto de coisas que ajudam a alinhar certos pontos ou, pelo menos, a acreditar numa certa realidade. Há um elemento que importa, Nina tem uma relação próxima com Dean Blunt e há, desde que começou a lançar música – há cerca de dez anos – uma espécie de aura em que dá para debater com a verdade e a ficção. Por exemplo, o seu trabalho real é de personal trainer. É também nutricionista. Estes dois elementos são bem capazes de ser verdade.
Porque se juntam à música. E à ideia – que foi sempre boa, com ela e com os bar italia – de que tudo isto é temporário (mesmo não sendo, mas faz parte aceitar isso para entrar no ritmo da coisa). Em 2015 editou Fitness Povero – Homeworks OST para acompanhar os seus trabalhos de fitness. Desde então a sua música tem aparecido em edições de autor ou através da World Music – editora de Dean Blunt -, num registo quase sempre digital, em lançamentos crípticos e que contribuem para a aura de Nina. Nasceu em Roma, mudou-se para Londres quando era ainda muito nova. Sozinha, para ir tentar a sua sorte. A sorte tem-lhe sorrido, os bar italia tornaram-se num fenómeno do dia para a noite – mal assinaram pela Matador em 2023 – e a sua carreira a solo tem vindo a ser descoberta por aqueles que não estavam tão atentos. A verdade é que não tinham de estar, durante anos Nina era algo que vivia no imaginário surreal da World Music, que quase se experiencia como um culto e, por vezes, castiga quem não está mais atento: alguma música desaparece tão rapidamente quanto aparece. Esta espécie de coisa vaga, ou fumo, que circunda Dean Blunt serve na perfeição Nina. E vice-versa.
A solo a pop/rock não é tão frontal como nos bar italia. Seja em Classics (2021) ou em Twins (2020) ou nas canções que vão caindo aqui e ali, há um arrastar pop que se alinha com o constante desaparecimento. A música de Nina não pode existir sem o nevoeiro que cria, como se quisesse desaparecer em si mesmo, isto é, extinguir-se após ser ouvida. Se é a música que confirma a existência de Nina, é também ela que teima em que se oiça Nina como algo fugaz, momentâneo, pronto a desaparecer. Mais do que imprimir urgência em ser ouvida, confere a necessidade de saborearmos o momento. Como se cada canção nos dissesse que será a última que ouvimos. Sem dramas ou exageros, é o gesto de quem cria algo com um fim, em volta de um fim e que vive para esse fim. É por isso que sabemos que Nina é real, que a sua música é real e que a podemos aceitar como real. AS
