Parte do magnetismo do frontman dos Iceage – e já o confirmámos por diversas vezes ao vivo – tem a ver com uma combinação explosiva de confiança e arrogância benigna que exala da sua pessoa. Parte disso foi o que nos atraiu para os Iceage do início e para as suas diversas transformações ao longo da década seguinte, como se essa afirmação pessoal do seu vocalista contaminasse e nos fizesse acreditar piamente no que eles eram, ou queriam ser. É, também, por isso que quando lemos que Elias se apresenta como músico e poeta não estranhamos. Não é por nos convencer, há um fundo de verdade nisso. Nem que seja pela poesia via pose. Agora, depois dos trinta anos, editou o seu primeiro álbum a solo. É “Heavy Glory” que traz a Lisboa em Fevereiro.
O que encontramos a solo é mais uma das tangências da sua personalidade, disposto a deslocar-se onde for para transmitir uma ideia, Rønnenfelt apresenta o amor e o apocalipse alcoólico via americana e um desvio para o country, mais metódico do que mimicado. As canções de “Heavy Glory” não têm dúvidas como por vezes encontramos nesse roteiro musical, mas estão cheias de determinação e evocam certezas com eloquência, como se o rebelde, o frontman dos Iceage, quisesse crescer mas ele próprio não o deixasse. É um homem preso na sua própria autossatisfação e é isso que contempla e é contemplado na forma como trasveste canções como “Close”, “Stalker” ou “No Place To Fall”. Enquanto outros amarguram nessa prisão, Elias Rønnenfelt está fora disso, reforça a presença da sua pessoa em cada verso, num misto de hedonismo e autopreservação, enquanto canta, como sempre cantou, com o narcisismo brutal que encantou uma (bem, mais do que uma) geração. Enquanto muitos músicos cantam para sobreviver, Elias Rønnenfelt escreve, canta e compõe para preservar uma visão única que tem de si. No tempo da exaltação do individualismo e do narcisismo de bolso, tem que se achar bonito alguém que o faz tão bem pelas vias clássicas da coisa. Sem rodeios ou falsidades, é exactamente tudo aquilo que se propõe a ser, Elias Rønnenfelt é um homem a olhar-se ao espelho. AS