Assente na trajectória de celebrações do trigésimo aniversário da ZDB, acolhemos uma noite que reportando ao passado desta casa, não só celebra o seu legado, como recontextualiza a sua pertinência no presente e, acto contínuo, aponta sempre para possíveis futuros. Programador da ZDB no período entre 2003 e 2006, ao lado de Pedro Gomes, Nélson Gomes viria a continuar essa visão conjunta com a formação da editora Príncipe em conluio com Zé Moura e Márcio Matos, essencial na disseminação da música de dança daqui feita nas periferias, e da promotora e agência Filho Único, cujo trabalho ao longo deste tempo não só tem sido vital para a tessitura cultural desta cidade, como tem também criado uma forte rede de alianças que a liga umbilicalmente a esse processo de descoberta nos tempos do Aquário. Estágio que veio a fincar uma personalidade mui própria à ZDB, marcado pela coragem em sondar cantos recônditos das músicas mais fora e lampejar nomes hoje sobejamente reconhecidos antes do facto, e que tem vindo a ser reflectido com outras visões mas igual propriedade nestes anos consequentes. Carta branca, mais do que óbvia, portanto, a Nélson Gomes para a escolha de assunto desta noite de celebração, com um line up que ao invocar essa memória lhe dá vida no presente. BS
Dj Marfox ⟡ Fantasia ⟡ Lobster ⟡ Maria Reis ⟡ White Magic
Lobster
Regresso tão surpreendente quanto esfuziante daquele que foi, durante a sua primeira existência, o mais celebrado power duo a operar por aqui. Formados por Guilherme Canhão na guitarra e Ricardo Martins na bateria, deixaram bem vincadas memórias de concertos lendários, onde o alto volume e um ataque furioso aos sentidos se revestia de um sentido de comunhão colectiva, nunca hostil. Na simbiose entre os riffs e melodias esquinadas e electrificadas de Canhão e a bateria espasmódica de Martins, o estrépito do hardcore, do rock e do noise era continuamente celebrado numa música tão expansiva quanto memorável, do mosh-pit à dança, deixando pelo caminho petardos-hino como ‘Farewell Chewbacca’ ou ‘Hot Flamingos’. Mas ao invés do mero revisionismo da matéria dada, Lobster regressam com olhos no futuro, num momento em que preparam um novo álbum, e num acto que será nas palavras de Martins para “suar e rir juntos”. Como dantes, como sempre. Keep it Brutal! BS
White Magic
Nave de Mira Billotte, artista actualmente sediada em Los Angeles e cujo ofício de magia está íntima e espiritualmente ligado ao trabalho de programação levado a cabo por Nélson e Pedro Gomes na ZDB circa 2006. Não tendo sido presença no espaço nessa altura, White Magic inseria-se numa espécie de comunidade livre de pontos geográficos ou taxonomias de género para onde acorriam músicas feitas nas margens, em exploração, capaz de albergar a tradição folk e blues, o improviso, psicadelismo, formas bastardas de rock ou músicas de transe sob um mesmo espírito libertador: NNCK, Sunburned Hand of the Man, Gang Gang Dance ou Fursaxa foram alguns desses nomes trazidos ao Aquário. Há assim um alinhamento espiritual entre esse passado e esta materialização, sempre pertinente, de White Magic neste palco: canções hipnóticas, tão devedoras da lanzeira da West Coast como do cancioneiro folk mais rural, pairando num limiar de estranheza acolhedor, e que tem em ‘Dat Rosa Mel Apibus’, lançado em 2006 pela Drag City, um clássico ainda a ser devidamente resgatado. BS
Maria Reis
Dona e senhora das canções da vida de muita gente deste país, Maria Reis regressa à ZDB a solo enquanto o fascínio e emoção por ‘Suspiro…’ estão ainda bem, bem longe de se esgotar. Sem querer entrar pelo discurso cansado da maturidade, mas reconhecendo alguma inevitabilidade não-fatalista nisso – e é verdade que estamos todas a envelhecer com a Maria -, ‘Suspiro…’ trouxe uma certa calma e ponderação na forma de fazer as coisas que em nada traiu a urgência que palpita sempre das suas canções. E estas, como ‘T-Shirt’ ou ‘Estagnação’, são já cantadas em uníssono por onde quer que actue. BS
DJ Marfox
Inaugurando o catálogo da Príncipe em 2011 com o manifesto ‘Eu Sei Quem Sou’, Marfox está intimamente ligado à Filho Único nem que fosse pela associação desta à editora lisboeta. Figura de proa da batida nascidas nos subúrbios desta capital, Marfox é hoje referência absoluta para inúmeras almas que viram no seu espírito de descoberta, visão e resistência face a possíveis adversidades um exemplo de perseverança e ambição benigna. Mestre absoluto a comandar a pista, apresenta-se aqui para um dj set passados oito anos desde a edição de ‘Chapa Quente’. Demasiado tempo. Mas tudo a seu tempo. A ver se descortinamos feras novas no fluxo. BS
Fantasia
Alias de Nélson Gomes, o congeminador desta noite de celebração. A ter aqui também o seu espaço para revelar nos decks todo o seu conhecimento e entusiasmo pela descoberta e pela partilha. BS