Se a música não servir para transgredir – ideias e margens, preconceitos e barreiras, géneros, regras e o que mais possa merecer o nosso desrespeito ou a nossa vontade de mudança – então é bem capaz de não merecer a atenção de quem procura na música a força transformativa que sempre mostrou ter nos momentos mais importantes (e a música serviu para fazer levitar o Pentágono nos anos 60, para incendiar ruas nos anos 70, para erguer toda uma nação das inner cities da América dos anos 80, para cuspir no tédio nos 90 e para confirmar que o futuro nos merece a todos já neste milénio).
É isso que faz Linn da Quebrada, “artista multimídia e bixa travesty”, como ela mesma se apresenta em bom brasileiro no seu sítio da internet. Ao Huffpost Brasil, a artista assumiu que usa a música como arma (como de resto todas as revoluções, com ou sem cravos…): “como arma voltada para mim mesma”, esclareceu ainda, explicando mais: “Olhando para os meus desejos, olhando para o meu desejo sempre voltado para um macho. Ao mostrar essas ideias para outras pessoas, percebo que muita gente se identificava”.
E isto porque a ditadura heteronormativa exige hoje esse combate, nem que seja pela força do que a própria Linn descreve como “afro-funk-vogue”, a fórmula que Madonna parece procurar em Lisboa e que já foi inventada, por necessidade, lá na quebrada, no morro, onde sobreviver é mais difícil e superar é a única solução. Depois de se estrear em 2016 com o tema “Mulher”, Linn conseguiu apoio colectivo para a gravação e edição de Pajubá, disco de estreia com produção de BadSista, que também a secunda ao vivo.
E o “show” (“to show” quer dizer mostrar, não é?…) de Linn exibe essa mulher que não se contenta com a norma, que quer transgredir porque isso significa sobreviver: “eu procuro um diálogo com o meio TLGB e um diálogo comigo”, confessa-nos ela. “Eu sempre vi no funk uma grande potência no que diz respeito a produção de desejo e sexualidade. Eu quero produzir esse desejo em corpos que de alguma maneira estão em um contexto parecido com o meu”. Tudo dito. Agora é suar esse desejo com funk de quebrada adornado com vogue de fantasia. RMA